Reflexões sobre o tempo e o espaço...

Desnorteado, o aprendiz perguntou-lhe: "Como devo segurar o arco para atingir tal distância?”
"Atire como de costume sem se preocupar com o alvo e com a mente livre de pensamentos" diz o mestre. Mesmo assim, o aprendiz não conseguia atirar sem ver o alvo e angustiado, reafirmava que precisava vê-lo para atirar.
O mestre reforça: "Procure apenas esticar o arco, até que a flecha parta. É preciso deixar que a coisa se faça." E pegando seu arco, o esticou até o limite e lançou a flecha que atingiu o alvo bem ao centro. Nesse momento explica, o mestre: "Feche lentamente os olhos até que o alvo fique um pouco esmaecido e pareça aproximar-se de você, até que ambos sejam um, pois quando o alvo e o atirador se tornam um, a flecha que parte do centro, chega no centro. Por isso, não se deve mirar o alvo, mas sim a si mesmo."
Profundamente desesperado, confessou ao mestre que se sentia incapaz de compreender e de aprender a atirar sem mirar. Com isso, o mestre, levou o discípulo a sua casa e atirando flechas no escuro com uma pontaria impecável, conseguiu que seu aprendiz acreditasse que era possível, e tentasse fazê-lo sem se preocupar com o olhar do mestre e sem pensar em nada.
"A mirada que leva da existência ao nada, sempre retorna à existência, não porque o atirador queira voltar, mas porque ele é levado a isso. A descrição das experiências vividas pelo atirador não pode ser explicada por nenhum raciocínio." diz o aprendiz.
Conclui o mestre: "Atingir cem vezes seguidas um alvo pode não passar de tiros medíocres, porém conseguir atirar uma única vez, que seja, sem nenhuma intenção de êxito e com pureza de coração é a verdadeira sabedoria."
Lendo esse pequeno trecho relatando a experiência de um aprendiz ocidental, com um mestre oriental, parei para refletir sobre a dificuldade que o aprendiz em estar presente e desapegar-se de seus objetivos e pré-ocupações com relação ao alvo. E sobre o ensinamento do mestre sobre a experiência se fazer, quando um está presente e se torna um com meio.
Como o aprendiz, quantos de nós conseguimos realmente estar presentes, no momento que estamos vivendo?
O que percebo é que, principalmente aqui no ocidente, vivemos quase que o tempo todo em algum outro lugar e num outro tempo, que não os que estamos no presente momento. Esse é um fenómeno tão recorrente, que já nem nos damos conta dele e muito menos paramos para refletir.

É curioso que isso aconteça, pois a vida acontece no momento presente, em tempo 0, e se pensamos bem, é como se passássemos praticamente a vida toda não “vivendo” a vida de fato, porque estamos vivendo o que já passou ou o que ainda não aconteceu.
Estamos sempre enraizados em nossas mentes e não no momento presente, porém, uma parte de nossa mente é memória e a outra é imaginação, o que resta???
Tanto o tempo, quanto o espaço são invenções humanas para organizar nossa forma de viver, mas eles são ilusórios e relativos, como já diziam os físicos quânticos. São instrumentos cognitivos da nossa consciência, inclusive, nem o nosso funcionamento como seres humanos e o de nenhum outro ser existente, segue a estrutura linear do tempo e do espaço, somos o resultado da conexão das nossas experiências e sentires, que nos permitem uma maneira única, atemporal e não linear, de perceber e agir no momento presente.
O futuro e o passado são formas de estar no presente e quando vivemos nesses espaços, não logramos estar inteiros no momento presente, e assim não vivemos integralmente... e a vida vai se esvaindo entre nossos dedos, nos trazendo uma noção de tempo muito real, pois só nos damos conta do tempo, quando ele já passou, porque aí o utilizamos para explicar nossas experiências, localizando-as no tempo e no espaço.

Estar conscientes, inteiros e presentes no momento presente, no centro de nós mesmos, desapegados de nossas certezas e deixando que a vida surja na deriva do viver, nos permite realmente viver, aprender, escolher e encontrar a verdadeira felicidade, que está dentro de nós, assim como todo o resto.
"O tempo e o espaço são modos pelos quais pensamos e não condições nas quais vivemos." [Albert Einstein]
Fica a reflexão: Onde estás, enquanto tua vida acontece? A que certezas estás apegado?
Namastê!
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